Habilitação Cassada – tem que começar tudo de novo para voltar a dirigir?

A penalidade de cassação da habilitação tem sido uma realidade em grande parte dos estados brasileiros nestes últimos anos. São milhares de processos instaurados anualmente visando a retirada da habilitação de condutores, numa punição considerada mais rigorosa que a própria suspensão.

Para você que talvez tenha dúvidas quanto às diferenças dessas penalidades, encare a suspensão do direito de dirigir (prevista em especial no artigo 261 do CTB) como um impedimento temporário (variando de 2 a 24 meses, conforme o caso e se há ou não reincidência), na qual o condutor fica impossibilitado de conduzir, mas não deixa de ser habilitado, apenas deve cumprir o prazo, realizar curso de reciclagem e obter aprovação no mesmo, mediante um exame com questões de múltiplas escolhas. Já a cassação, que é o que nos interessa aqui, é um impedimento definitivo (não confunda com permanente, pois não há punição perpétua no trânsito), ou seja, o condutor torna-se inabilitado, só podendo retornar à direção passados dois anos da cassação e se submetendo a um processo chamado reabilitação.

A grande questão é: condutor que foi cassado deve fazer todo o processo de primeira habilitação novamente? Para entendermos esse tema, devemos desconsiderar aqui a Permissão para Dirigir que, em que pese o artigo 256 do CTB prever sua cassação, em nada se assemelha a cassação da CNH (conhecida popularmente como habilitação definitiva).

Percebo uma confusão, até mesmo em alguns materiais de renomados autores, que entendem que o condutor cassado deve se submeter a TODO o processo de primeira habilitação, como se fosse sua primeira vez. Ora, não é isso que se depreende da leitura dos artigos 263 do CTB e das resoluções 168/04 e 182/05.

É claro que a redação das nossas normas de trânsito sobre o tema poderia ser melhor, mas não é tão difícil chegar à conclusão de que o condutor cassado NÃO DEVE FAZER todo o processo de habilitação novamente.

Diz o parágrafo 2º do artigo 263 do CTB:

§ 2º Decorridos dois anos da cassação da Carteira Nacional de Habilitação, o infrator poderá requerer sua reabilitação, submetendo-se a todos os exames necessários à habilitação, na forma estabelecida pelo CONTRAN. (grifamos)

Perceba que já na leitura da lei 9.503/97 (que instituiu o CTB), vemos que o processo a que se submete o condutor que foi cassado, após dois anos disso, chama-se REABILITAÇÃO e consiste APENAS na realização dos EXAMES da primeira habilitação, quais sejam o de Avaliação Psicológica, Aptidão Física e Mental, Teórico-Técnico e de Prática de Direção Veicular, não sendo mencionado NENHUM dos cursos que o candidato a Primeira Habilitação se submete: teórico-técnico e Prática Veicular. Posto isso, já poderíamos encerrar aqui a questão, percebendo que não se trata do processo todo novamente. Porém, vamos observar como o CONTRAN estabeleceu a cassação e, principalmente, como se dá esse processo de reabilitação, diverso de qualquer outro previsto atualmente.

Primeiro vamos verificar que a Resolução 168/04, bem como suas inúmeras alterações, versa sobre o processo de habilitação, os cursos especializados, mudança de categoria e também curso de reciclagem, além de reforçar as exigências do curso de reabilitação citado pelo CTB.

Vale mencionar que o CONTRAN inovou com o artigo 42 da resolução supracitada, na medida em que passa a prever, além dos exames, curso de reciclagem, o que não existe na previsão legislativa (aliás, tema que inclusive tem sido discutido no Poder Judiciário e merece nossa atenção noutro momento). Leia-o:

Art. 42. O condutor que tiver a CNH cassada, após decorrido o prazo de 02 (dois) anos da cassação, poderá requerer sua reabilitação, submetendo-se ao curso de reciclagem e a todos os exames necessários à mesma categoria da que possuía ou em categoria inferior, reservando a data da primeira habilitação. (grifamos)

Mais uma vez fica evidenciado que o chamado processo de reabilitação depende apenas da realização dos exames previstos da primeira habilitação somados, agora, com curso de reciclagem (que é, atualmente, de 30 horas/aula, e não 45 como o curso da Primeira Habilitação). Isso também é reproduzido no artigo 21 da resolução 182/05 do CONTRAN que trata justamente da uniformização do procedimento administrativo para imposição dessa penalidade.

Art. 21. Decorridos dois anos da cassação da CNH, o infrator poderá requerer a sua reabilitação, submetendo-se a todos os exames necessários à habilitação, na forma estabelecida no § 2º do artigo 263 do CTB.(grifamos)

O artigo 42-A, incluído na resolução 168/04 pela resolução 169/04 assim versa:

Art. 42A. A reabilitação de que trata o artigo anterior dar-se-á após o condutor ser aprovado no curso de reciclagem e nos exames necessários à obtenção de CNH da categoria que possuía, ou de categoria inferior, preservada a data da primeira habilitação. (acrescentado pela Resolução nº 169/05)(grifamos)

Se ainda restava dúvidas de que o condutor cassado teria que fazer todo o processo de primeira habilitação (aliás, se assim fosse, não poderia ser chamado de primeira habilitação, mas de segunda habilitação, pois não há como fazer pela primeira vez algo que já foi feito antes!), elas caem por terra na leitura do artigo acima incluído pela resolução 169/04: veja que o condutor cassado, após dois anos, passa por um processo de reabilitação, que já conhecemos suas exigências (todos os exames e curso de reciclagem), porém pode optar por fazer o exame de direção na categoria que possuía ANTES DE SER CASSADO, ou seja, se habilitado na categoria AE, apenas fará exame prático de direção veicular na categoria A e na categoria E, sendo-lhe expedido documento com as referidas categorias, ou ainda pode optar por fazer exame em categoria inferior, se ver alguma vantagem nisso.

Ora, como poderia ser um processo de primeira habilitação todo de novo se o candidato cassado pode voltar a ter as categorias que possuía antes? Existe primeira habilitação para categorias C, D ou E? Por certo que não e, se ainda pairava qualquer dúvida, não é possível que esta persista.

Mas existe DETRAN que aplica a penalidade e possui um processo de reabilitação diferente do que este texto aborda? Pelo que já observei de conversas com profissionais das mais diversas unidades da federação, infelizmente a resposta é sim. Mas a legislação não é nacional? Certamente que sim, porém, perceba que se alguns órgãos executivos estaduais interpretam e aplicam de modo diverso, o que esperar do profissional instrutor ou mesmo do candidato cassado?

Por isso reitero a afirmação que tenho feito desde a participação no I CONATRAN de 2016: se algum Estado está exigindo todo o processo de habilitação (incluindo curso teórico de 45 horas/aula e curso prático de direção), está cometendo um grande equívoco e deve rever seu entendimento.

Ao cidadão e profissionais da área, fiscalizem no seu Estado e verifiquem se a norma NACIONAL está sendo respeitada pelos próprios DETRANs. Caso contrário, comunique ao DENATRAN e ao CETRAN tal irregularidade.

Mas se divergem quanto à preparação durante aulas práticas de direção. Enquanto o Peternelli propõe que esse treinamento aconteça com a instrução de qualquer condutor habilitado há mais de 3 anos, o parlamentar Kataguiri sugere que as aulas só poderiam acontecer acompanhadas de instrutor autônomo (desvinculado de autoescola) com CNH há mais de 5 anos e ainda sob autorização do Detran.

Percebe-se que a segunda proposta NÃO RESOLVERIA o principal problema, que é evitar altos custos com a obtenção da CNH, pois as aulas continuariam obrigatoriamente sendo ministradas por um profissional instrutor, o qual obviamente vai cobrar pela execução do seu trabalho.

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